Volta da fome, capitalismo e um desastre à direita.

Guido Dingemans, De Eindredactie/Getty Images

Texto escrito por: Robson Souza.

As políticas de austeridade que vem sendo sistematicamente implantadas no Brasil, ganharam ainda mais corpo após a eleição de um governo de direita e com o amplo apoio de setores empresariais e das classes mais abastadas, segue aprofundando com uma “eficiência” absurda o abismo existente entre diferentes as diferentes classes sociais. Ao longo desses dois primeiros anos de seu mandato, Bolsonaro se quer tem falado sobre combate à pobreza e as desigualdades, e ao invés disso contrariando a realidade, mente ao dizer que brasileiros não passam fome.

O problema da fome no país que apesar de ser bastante antigo, nas últimas décadas foram combatidos através de políticas públicas e sua pretensa superação foi tratada como prioridade por aqueles que até então ocupavam o Estado. Programas como o Bolsa Família e o Fome Zero, foram alguns dos responsáveis pela saída do Brasil do mapa da fome e a retirada de milhares de famílias da pobreza extrema.

Fatos que precisam ser reconhecidos, entretanto, como explicar que em tão pouco tempo depois aproximadamente 20 milhões de pessoas que vivem entre nós estariam passando fome neste exato momento? E tudo isso num país que comemora por ser um dos recordistas em produção de alimentos e do agronegócio que se acha pop por literalmente alimentar o mundo, mas conforme temos visto é incapaz de adotar uma postura nacionalista em defesa da soberania alimentar da próprio nação. A conta entre produção e oferta acessível de alimentos para os brasileiros simplesmente não fecha, o agro é realmente POP?

As grandes taxas de desemprego que se somam a um encarecimento assustador de itens essenciais da nossa cesta básica, explicam até certo ponto a atualidade da fome que avança depressa sobre nós, mas por outro lado também podemos questionar a efetividade das políticas públicas de combate às desigualdades postas em pratica na última década. Olhando para esse passado recente eu me pergunto o que não deu certo, e por que temos que superar a fome mais uma vez.

Parece obvio de que a fome atual deve ser observada a partir desse contexto, mas é contraproducente não lidar como o nosso passado, seja o mais recente ou aquele referente a períodos mais remotos. Vivemos em nosso país um problema gravíssimo de desigualdade social que vem se arrastando por séculos, e a fome é só mais um dos efeitos causados por uma acumulação selvagem de um número monstruoso de bens materiais por pouquíssimas famílias.

Os efeitos de uma crise sanitária de nível mundial e que vem sendo gerida em nosso país com o objetivo único de garantir a máxima acumulação de capital e a manutenção dos lucros do empresariado, mesmo que para isso não haja nenhuma política de preservação da vida de seu povo e da classe trabalhadora, se efetiva com o enriquecimento indecente de alguns setores considerados dispensáveis neste momento e pela morte de quase meio milhão de pessoas.

Ao olharmos para as várias tentativas do atual presidente em sabotar as vacinas, o pagamento do auxílio emergencial e sua preocupação genuína com setores da burguesia, temos a dimensão exata de quem ele de fato representa. E caso ainda lhe reste dúvidas sobre os interesses representados por ele, se assim como eu você não faz parte de uma minoria endinheirada que vive de renda, ele definitivamente NÃO defende nossos mesmos interesses.

A tragédia em se priorizar o acumulo de bens em detrimento da morte de uma maioria, é desde sempre a lógica pela qual o capitalismo tem operado e grupos de direita tem atuado exatamente por este mesmo princípio. Tudo isso nos leva a pensar que o aprofundamento do colapso social em que vivemos não é apenas mero detalhe, as coisas pioram por que a intenção é justamente esta.

O título do texto é uma tentativa de mostrar a relação bastante íntima entre capitalismo e direita e seus efeitos práticos e devastadores, inclusive muitos do que vivemos hoje. Não por acaso são de setores que tendem mais a direita que parte o desejo sedento de privatizar bens públicos pelo país, atendendo os interesses das nossas elites, causando com isso um impacto direto na qualidade e na oferta de serviços essenciais para populações mais vulneráveis. É importante que não haja dúvidas sobre qual o papel do capitalismo e da direita nesse vai e vem da fome no Brasil, sobretudo para construirmos novas possibilidades e alternativas de vida.

Se é no capitalismo que a produção de alimentos se eleva a níveis extraordinários, como lidar com o fato de que apesar das circunstancias a fome nem ao menos deixou de ser uma realidade comum entre nós. O que nos leva a pensar que sim, tanto a presença quanto a ausência de políticas públicas de combate à fome ou de redução das desigualdades, são frutos de escolhas políticas daqueles que teoricamente deviam nos representar. Se a miséria e fome não são condições naturais, temos que nomear seus responsáveis.

Mas neste momento temos uma emergência bem maior já que a fome segue avançando de forma violenta sobre muitos de nós, e por isso mesmo nossa urgência não pode se limitar a um simples rastreio em busca de sua origem no passado, é preciso encarar a fome agora já que ela não espera. Qualquer estratégia no plano institucional passa pela redistribuição da renda por meio do pagamento do auxílio emergencial em seu valor inicial, garantindo que todas as pessoas em situação de vulnerabilidade sejam assistidas.

O paradigma que se apresenta neste caso é que se a solução do problema da fome não escapa a instancia política, e como já sabemos, a fome não deixa de ser um problema que se inicia e se aprofunda na esfera política, temos a frente um enorme desafio. Infelizmente a falta de interesse do governo federal em impedir que pessoas passem fome é tamanha que o valor proposto para o pagamento do auxílio era de míseros duzentos reais, além da sua suspensão mesmo sem o fim da pandemia.

Se a nível institucional temos pouquíssimas possibilidades de atuação neste momento, devemos continuar pressionando por um valor digno do auxílio e por sua manutenção até que as coisas melhorem, mas sem deixar de ajudar e contribuir para que chegue comida onde precisa. Sabemos das movimentações de coletivos e organizações empenhadas no combate a fome, e o caminho é bem por aqui mesmo, mas é importante ter em mente que só a reforma agrária e distribuição de renda tem potencial de acabar com a fome.

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Crédito da imagem: Guido Dingemans, De Eindredactie/Getty Images.

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